quinta-feira, 2 de agosto de 2007

EXTRATOS DO LIVRO «Gritos contra a indiferença de Fernando Nobre»

Antes de abordar as questões bioéticas concretas com que se confrontam as organizações humanitárias, importa reafirmar, quanto a mim, que: a) compete ao médico, antes de tudo, proteger os que são mais vulneráveis; b) é essencial o respeito pelo direito humanitário internacional e pelos Direitos do Homem c) o direito à saúde é uma exigência fundamental se se quiser atingir o desenvolvimento. Assim, podemos afirmar que a bioética está certamente relacionada com a luta contra a pobreza e a vulnerabilidade, assim como ligada ao valor da vida. Hoje, as grandes questões bioéticas para nós, «humanitários», são, indiscutivelmente: 1- A questão da acessibilidade dos medicamentos (…) 2- A questão da ausência de pesquisa no que diz respeito às doenças esquecidas ou às doenças ditas órfãs. (…) 3- A questão dos ensaios clínicos. As experiências realizadas por certas multinacionais farmacêuticas (…) 4- O intolerável que é saber que diariamente morrem cerca de 40 mil crianças de doenças perfeitamente evitáveis (…) 5- A importância de lutar pelas acessibilidades para que um quinto da população mundial que vive com menos de um dólar por dia possa ter acesso às estruturas de saúde, aos alimentos e à água. 6- A importância da questão do tráfego do sangue e dos órgãos sobre o qual nos teremos de manter particularmente atentos. 7- A questão da vontade de apropriação , por algumas multinacionais, do mapa do genoma humano, assim como a questão dos organismos geneticamente modificados (…) 8- A questão da utilização do urânio empobrecido em armas (…) Para concluir, diria que é fundamental que regressemos ao legado da medicina hipocrática, na qual o doente estava no cerne das preocupações do médico. É fundamental também que se respeitem os princípios éticos da pesquisa médica e dos ensaios clínicos para todos. Efectivamente, como está escrito nos princípios de base da Declaração de Helsínquia, o bem individual da pessoa deve prevalecer, em qualquer ensaio clínico, sobre os interesses da ciência ou da sociedade. Em suma, é fundamental, estejamos nós no hospital ou numa instituição médico-humanitária, que não nos esqueçamos de que a razão de ser do médico é o desejo de atenuar o sofrimento e de lutar pelo doente. É isso que os humanitários fazem e continuarão a fazer e é por isso que pugnarão, como têm pugnado, pela defesa dos princípios éticos e bioéticos sem os quais a medicina não eficaz. É fundamental, pois, que possamos reafirmar os princípios da dignidade humana, da liberdade, da igualdade de direitos e da solidariedade entre os indivíduos e as nações que são o pilar da comunidade internacional. Nesse sentido, nós, os médicos, temos ou deveríamos ter um lugar ímpar na luta pela dignidade do Homem. É isso que temos de fazer e mesmo, se necessário for, manifestar toda a nossa revolta e todo o nosso repúdio por comportamentos menos claros e pouco éticos quando com eles formos confrontados. Temos de os denunciar para fazer que as tragédias futuras possam ser minoradas, ou mesmo evitadas. (…)

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