sábado, 11 de agosto de 2012

70 PINCELADAS DE PALAVRAS PARA UM RETRATO EM MOVIMENTO DO RUI

Texto escrito pelo António Cardoso Ferreira para o septuagésimo aniversário do Rui d'Espiney:



Há um sorriso a entornar-se-lhe pelo rosto
sempre que saboreia um pedaço de vida
que lhe traga um gosto novo
para descobrir e relacionar com a imensa teia
que percorre os múltiplos caminhos
do seu ser-com-tudo-o-que-se-move-nas-pessoas-e-no-mundo

Aliás a luz que há nesse sorriso
tem a sua origem nas artes de escutar atento
e interpretar meticulosamente cada circunstância

É uma forma de respirar que até parece simples
apesar de toda a sua complexidade

O corpo é esguio
a esticar-se pelos braços e pelas pernas
até às extremidades
como quem procura chegar ainda um pouco mais longe
em cada milímetro de vida

As mãos exprimem-se por palavras
que se soltam dos dedos
e voam em muitas direcções
entrelaçando-se com pensamentos vários
até que tocam o íntimo das coisas e de nós

O olhar vai fluindo como um rio
às vezes largo e transparente
outras irrequieto aventureiro
em rápidos e cascatas que se arriscam
p’ra desbravar futuros

Mas voltemos um pouco mais atrás
cruzando o seu olhar na paz de alguns momentos
com o sorriso a emergir timidamente
e descobrimos-lhe a porta dos afectos
dos sabores dos humores
do espanto perante o dia
e da sua abertura ao inesperado:
-é então que o silêncio tão calado
ganha a pura consistência da poesia

Só depois poderemos pintar-lhe o deambular dos passos
tacteando no espaço a pequena fresta
que se possa enfim atravessar
até onde o ar corra livremente
e surjam outros horizontes

Ao sol poente a sua sombra longilínea
adquire a densidade das memórias:
-aí revivem tempos solitários
palavras partilhadas
e encontros de muitas e muitas mãos
gerando movimentos de mudança
com trocas de energia
entre a vida e os sonhos que a sustentam

(REMATE FINAL DO QUADRO PINTANDO O CENÁRIO COM REFERÊNCIAS A
ADÁGIOS POPULARES E Á ETIMOLOGIA DE ALGUNS NUMERAIS CARDINAIS
ATÉ QUE TUDO DESAGUA NUMA CANÇÃO DE JOSÉ MÁRIO BRANCO )

Quem aos “sessenta” não se sentou
irá interpretar como condicional
a primeira sílaba dos “setenta”
e conjugará o ver
bo tentar sempre no presente
pela estrada do tempo que aos “oitenta” leva
em busca da resposta escondida
ás perguntas que todos os dias se refazem
com muitos ses porquês e com quem
perguntas animadas pela secreta esperança
de que talvez algures pelos “noventa”
venha a descobrir algo de novo
que sacie a sua inquietação…

“Cá dentro inquietação inquietação
é só inquietação inquietação
porquê não sei porquê não sei ainda

Há sempre qualquer coisa que está para acontecer
qualquer coisa que eu devia perceber
porquê não sei porquê não sei ainda

Há sempre qualquer coisa que eu tenho de fazer
qualquer coisa que eu devia resolver
porquê não sei mas sei
que essa coisa é que é linda!


6 de Agosto de 2012

António Cardoso Ferreira

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